Quadro "O Pesadelo" de Henry Fuseli (1741-1825)

* A Peste Onírica é um delírio subversivo. Postamos aqui nossas réles "produçõezinhas"; nossos momentâneos surtos de divagações em nome do Real do Simbólico e do Imaginário. Estão aqui nossos ensaios para que possamos alçar outros vôos num futuro próximo. Aproveitem os links, os materiais, as imagens, as viagens. Sorvam nossas angústias, nossas dores e masquem nossa pulsão como se fosse um chiclete borrachento com sabor de nada. Pirateiem, copiem, contribuam e comentem para que possamos alimentar nosso narcisismo projetivo. E sorvam de nossa libido, se assim desejarem.


domingo, 19 de setembro de 2010

Camille Claudel


Nos últimos meses Camille não sai do meu pensamento, então resolvi sublima-lá, postando coisas, lendo e falando sem compromisso.

Algumas coisas para usufruir:

* BAIXAR: REVISTA DA ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE N° 17 - Novembro – 1999 - NEUROSE OBSESSIVA.

* BAIXAR:  Filme Camille Claudel:


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Segue um resumo Biográfico:

Camille Claudel, Aisne, 8 de dezembro de 1864 — Paris, 19 de outubro de 1943).

Camille Claudel nasceu um ano e três meses após a morte prematura, com 15 dias, de seu irmão mais velho Charles Henri. Sua mãe Louise permanece enlutada para o resto de seus dias e “nunca beijou um de seus outros três filhos.” A última carta de Camille escrita depois de vinte e cinco anos de internação e dirigida ao irmão Paul Claudel é ainda um apelo a um lugar no desejo da mãe, eterna enlutada. Ela escreve: “eu penso sempre em nossa querida mamãe. Nunca mais a vi depois que vocês tomaram a funesta decisão de me enviar a um asilo de alienados. Eu penso no bonito retrato que fiz dela em nosso jardim. Os grandes olhos onde se lia a dor secreta, o espírito de resignação... suas mãos cruzadas sobre os joelhos em abnegação completa: tudo indicava a modéstia e o sentimento de dever em excesso, era bem a nossa pobre mãe.” Louise, a própria mãe de Camille destruiu este retrato após internar a filha, cujos endereçamentos lhe eram insuportáveis.

Desde o seu nascimento Camille foi mal acolhida por sua mãe que esperava um menino para repor a perda do filho. Camille, a menina decepciona e é batizada com um nome que atende aos dois sexos. Para a mãe, ela sempre foi “uma criatura estranha e selvagem” com uma carreira que não era edificante para uma mulher. Aos doze anos Camille já trabalhava a argila, e aos quinze já havia esculpido David e Goliath e Napoleão. Seu primeiro mestre Alfred Boucher, a apresenta a Paul Dubois, diretor da escola Nacional de Belas Artes, que reconhece seu talento.

Camille através da arte de fazer surgir seres novos, cujos traços são marcados para sempre, fixados, congelados na frieza da pedra denuncia sua posição fantasmática diante do Outro.

Em 1881, com dezessete anos convence o pai a estabelecer a família em Paris para que ela e os irmãos pudessem aperfeiçoar seus estudos. No entanto Louis Prosper é obrigado a trabalhar em outra cidade, e só ia para casa aos domingos. A família nunca perdoou mais este “egoísmo” de Camille. O afastamento do pai é descrito por seu irmão, o escritor Paul Claudel como um cataclisma.

Em Paris no ateliê de Rodin, Camille logo se sobressai, tornando-se sua aluna, modelo predileta e amante. O mestre a mantém à parte, ele a privilegia. Ela trabalha de forma incansável, dedica-se às suas orientações e lhe serve sendo responsável pelos pés e mãos das suas obras e nessa época os dois produzem “a porta do inferno”. Até 1888 continua morando com os pais que ignoravam esta relação. Anos depois, sua mãe, escreverá que não quer mais vê-la, “pois ela tem todos os vícios”, e a acusa de tê-la exposto levando Rodin e a mulher, para jantar em sua casa, quando na verdade já viviam como amantes. Sua filha era uma prostituta que fazia o pai sofrer. Paul que tomou conhecimento do romance com Rodin antes da família, sente-se traído, reprova a irmã. As referências de Paul à sua irmã possuem um tom enciumado e de exaltação à sua beleza e genialidade.

Em 1888 Camille e Rodin passam a viver publicamente como amantes em uma velha mansão que se torna seu novo atelier. A família indignada recusa o contato público com ela. No entanto Rodin jamais abandona Rose Beuret.

A crítica a reconhece como uma artista de estilo próprio e genial, a sociedade, porém a condenava, e isso impedia que ela concorresse aos concursos para obras públicas. Camille engravida e Rodin a envia de férias para o interior, aos cuidados das chamadas fazedoras de anjo. Cria aí uma obra belíssima a pequena castelã, rosto de uma menina dirigindo para cima um olhar morto. Este aborto a “torna impura e suja” no dizer de Paul.

Por volta de 1893 Camille escreve a Rodin: “eu estava ausente quando o senhor veio, pois meu pai chegou ontem e fui jantar e dormir em casa(....) A senhorita Vaissiers me contou toda sorte de fábulas forjadas sobre mim em Islette. Parece que saio à noite pela janela de minha torre , suspensa numa sombrinha vermelha com a qual ponho fogo na floresta!!!”

Em 1892, rompe pela primeira vez o romance com Rodin e monta seu próprio ateliê na ilha de Saint Louis. Durante os sete anos que se seguem desafia o mestre, negando sua ajuda e desesperadamente tenta conseguir encomendas. Torna-se alcoólatra e é protagonista de vários escândalos. Expõe ainda duas vezes, mas não comparece em público, alegando que está feia e acabada para se expor. Em uma das cartas justifica a recusa em participar do Salão de Outono, por não poder apresentar-se em público com as roupas que tem no momento: “sou como pele de asno ou Cinderela, condenada a cuidar da lareira sem esperança de ver chegar a fada ou o Príncipe encantado que deve mudar minha roupa de pele ou cinzas em vestidos cor do tempo”. Pele de asno é outra forma metafórica de referir-se a posição feminina, a da mulher que espera o príncipe guardando sob as vestes as insígnias paternas.

Trancada em seu atelier, repete incessantemente “o canalha do Rodin” frase que é escutada pelos vizinhos. O meio artístico antes tido como ideal, passa a pertencer ao bando de Rodin que a todos seduz e convence contra ela. Suas idéias e seus desenhos serão roubados, executados, terão sucesso e seu nome será excluído. “Eu serei perseguida por toda minha vida pela vingança deste monstro, o perseguidor Auguste Rodin”. Até a morte, Camille mantém inalterada a certeza delirante de que Rodin a persegue. Em uma manhã só abre a porta para Henri Asselin que viria posar, após longa conversa. Ela estava desfeita, tremendo de medo, armada de vassoura em riste e lhe diz: “esta noite dois indivíduos tentaram forçar a minha janela. Eu os reconheci, são dois modelos italianos de Rodin. Ele lhes ordenou que me matassem. Eu o incomodo. Ele quer me fazer desaparecer.” A partir daí Camille todos os anos, no mês de julho, destrói a marteladas suas esculturas e depois some por algum tempo.

O pai que continua até o fim da vida mantendo-a financeiramente, insiste com Paul para que interceda junto à mãe a fim de que esta consinta em se aproximar de Camille “talvez esta louca varrida melhore”. Mas Louise é irredutível e assim se manterá até a morte. Em março de 1913, Louis Claudel morre aos 87 anos. Informada por carta pelo primo Charles Thierry ela responde “O pobre papai nunca me viu como eu sou; sempre lhe fizeram crer que eu era uma criatura odiosa, ingrata e má. Era necessário para que o outro pudesse tudo usurpar” e afirma que a família vai logo interná-la em uma casa de loucos, por acreditarem que ela é nociva ao sobrinho quando reclama seus bens “por mais que eu me encolha em meu pequeno canto, ainda sou demais”.

A internação de Camille em Paris ocorreu uma semana após a morte do pai. Louise estava livre e conseguiu um atestado com médico amigo da família e vizinho de Camille .O laudo de internação certifica que a senhorita Camille Claudel sofre de perturbações intelectuais muito sérias; tem hábitos miseráveis, é absolutamente suja, nunca se lava, vendeu todos os seus móveis, passa sua vida completamente fechada, só sai à noite, e tem sempre o terror do bando de Rodin, e que seria necessário sua internação em uma Casa de Saúde.

Camille vive a desordem absoluta, procura deseperadamente o reconhecimento. Preterida pela mãe e pelo amante, ela não tem lugar no desejo do Outro. Camille trai o pai na medida em que se apaixona por Rodin em detrimento de sua própria obra. Ela fracassa em superar o mestre e sustentar o nome do pai – sustentar o nome Claudel para o pai. Assim já não pode pertencer ao clã Claudel. Em uma de suas cartas escreve “teria feito melhor comprando belos vestidos e belos chapéus que realçassem minhas qualidades naturais do que me entregar à minha paixão pelas construções duvidosas e os grupos mais ou menos ásperos”, ou ainda “esta arte está mais de acordo com as grandes barbas e caras feias do que com uma mulher relativamente bem dotada pela natureza”.

Camille Claudel nos trinta anos em que passa prisioneira em um asilo escreve constantemente à mãe. Suas cartas eram repetidos apelos desesperados para que esta a tirasse do asilo, mas a resposta era implacável. As cartas da mãe de Camille para o diretor do asilo, proíbem que ela se corresponda com quem quer que seja, “pois suas cartas poderiam servir àqueles que faziam campanha contra a família Claudel devido a permanência da escultora no asilo. Segundo sua mãe Camille tem idéias as mais extravagantes, suas intenções são sob o ponto de vista das família sempre muito más, ela nos detesta, e está sempre pronta a nos fazer todo mal que puder” Aos pedidos endereçados à família , tanto por Camille quanto pelo diretor do asilo , sua mãe oferece uma soma maior em dinheiro para que ela permaneça internada. Sua mãe tinha horror de qualquer aproximação com esta filha que só trazia a vergonha e desonra.

Em 1930 uma última carta, esta dirigida a Paul “ hoje 3 de março é o aniversário de minha internação! Faz 17 anos que Rodin e os marchand de objetos de arte me enviaram para fazer penitência nos asilos. Eles é que mereciam estar nesta prisão, pois eles apoderaram-se da obra de toda minha vida através de B. que conta com sua credulidade e a de mamãe e de Louise. Eles diziam: nós nos servimos de uma alucinada para encontrar nossos temas! É a exploração da mulher o esmagamento da artista de quem se quer expremer sangue! Tudo isto no fundo sai da cabeça diabólica de Rodin. ...

Em outra reclama da comida e solicita que a mãe lhe envie os seus pedidos e que não gaste dinheiro pagando pelo que ela não consome no asilo. “Tem novidades de Paul? De que lado ele está agora? Ainda tem a intenção de me deixar morrer em um asilo de alienados? É bem cruel para mim. Isto não é lugar para mim”.

Camille Claudel morreu em 19 de outubro de 1943, após trinta anos de internação, aos 79 anos incompletos.

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